As organizações que abordam os motoristas de aplicativo são em grande número e com opiniões divergentes sobre a categoria, a forma ideal de organização e as prioridades na luta por direitos. Essas organizações podem se apresentar como associações, sindicatos ou simplesmente grupos de WhatsApp.
Leandro Medeiros, presidente do Sindicato de Motoristas de Aplicativo do Estado de São Paulo (Stattesp), defendeu que o principal progresso é o reconhecimento da categoria e a obrigatoriedade da negociação por meio de acordos coletivos.
“Atualmente, o trabalhador não tem direito a nada. Ele é obrigado a aceitar o que as empresas determinam. Com a aprovação da regulamentação, as empresas não poderão mais agir como bem entenderem. Haverá necessidade de uma negociação coletiva”, ressaltou.
A Associação dos Motoristas de Aplicativos de São Paulo (Amaps) se opõe à proposta do governo e apoia um projeto de lei alternativo apresentado por um parlamentar da bancada ruralista de Goiás, o deputado Daniel Agrobom (PL).
Eduardo Lima de Souza, Presidente da Amaps, argumenta que a proposta do governo elimina a autonomia dos motoristas.
“Nossa categoria é formada por trabalhadores autônomos, que já deixaram a CLT, fugindo tanto da CLT quanto dos sindicatos”, afirmou.
Conhecido como Duda, o presidente da Amaps sugere que a proposta busca somente a “arrecadação [do governo] e a entrega da classe dos motoristas aos sindicatos”. O presidente da Amaps conta com 23 mil associados e sustenta que os sindicatos “não são reconhecidos pela classe como representantes”, criticando que a negociação coletiva fique com as entidades sindicais.
Já Leandro Medeiros, presidente do Stattesp, assegura que tem 68 mil motoristas cadastrados e 5,8 mil sócios que contribuem financeiramente para a entidade. “A Constituição é clara: quem representa a classe trabalhadora é o movimento sindical”, ressalta.
Solimar Menacho, presidenta do Sindicato dos Motoristas por Aplicativo de Mato Grosso (Sindmapp), que conta com 19,5 mil membros, afirmou que a proposta tem vários aspectos positivos, tais como a obrigatoriedade da negociação por acordo coletivo, a necessidade de contribuição para a Previdência Social e o direito de contestar exclusões injustas da plataforma. No entanto, ela criticou a proposta de R$ 32 por hora de trabalho.
“Qualquer categoria para nascer, nasce com o mínimo e a gente vai ter que lutar para ter melhorias. Nós vamos enfrentar isso e vamos lutar”, garantiu.
A respeito da Associação que é completamente contra o projeto, a sindicalista argumentou que a função das associações é distinta. “As pessoas confundem o papel da associação e o papel do sindicato. A associação defende a causa civil, o lazer, uma parceria com o plano odontológico, essas coisas. O sindicato defende o trabalhador. O desejo delas [das associações] era estar na mesa de negociação. Mas quem participou das negociações foram os sindicatos, e desde então eles têm falado mal de sindicato”, explicou.
Solimar acrescentou que o acordo coletivo é fundamental. “No momento, nenhum aplicativo escuta o sindicato. Somente São Paulo, Rio e Minas que conseguiram dialogar com a Uber. Agora, nós vamos ter acesso, ao menos à Uber, para marcar uma audiência, conversar, reclamar, buscar melhorias”, completou.
Remuneração por hora
Uma das principais críticas da Associação dos Motoristas de Aplicativos de São Paulo é em relação à previsão de que a remuneração seja feita por hora trabalhada, e não por quilômetro (Km) percorrido e por minuto.
“O pagamento por hora não leva em conta as variações de demanda. Os ganhos precisam considerar o quilômetro percorrido e o tempo, o trânsito, a distância e o tempo de espera, que são fatores que influenciam diretamente na renda dos trabalhadores”, informou a Amaps.
Leandro Medeiros, presidente do Sindicato de São Paulo, destacou que o valor mínimo por hora foi estipulado para que o trabalhador pudesse ser incluído na Previdência Social.
“Nós defendemos o ganho por quilômetro percorrido. No entanto, não podemos incluir isso em um projeto de lei pois esse é um objeto de acordo coletivo. Os R$ 32 por hora foram estabelecidos para integrar o trabalhador no sistema de Seguridade Social. Nós vamos, sim, discutir o pagamento por km nos acordos coletivos. Porém, para isso, precisamos da unidade da categoria”, argumentou.
Representante dos trabalhadores de Mato Grosso, Solimar Menacho, acredita que o cálculo deveria ser feito por estado.
“Hoje, em Mato Grosso, a hora trabalhada custa de R$ 40 a R$ 48. Assim, estamos retroagindo. Em São Paulo, o valor é de R$ 55 a R$ 70. Entendeu? No Amapá, é menos de R$ 20 a hora. Então, para eles, está ótimo. Acredito que deveríamos analisar cada estado”, enfatizou.
Para Menacho, será difícil fiscalizar as plataformas para garantir que não bloqueiem os trabalhadores que alcançarem o valor mínimo por hora, mesmo com o projeto proibindo restrições de viagens.
“Nosso medo é que o motorista que atinge os R$ 32 sofra a famosa ‘bandeira branca’. Você fica parado esperando romper a uma hora e recomeça tudo de novo”, explicou Solimar, que alega que as empresas podem manipular a oferta de corridas.
Previdência Social
Outro avanço do projeto indicado pelos sindicatos é a obrigatoriedade de o trabalhador contribuir para a Previdência Social. Atualmente, o trabalhador que deseja ter aposentadoria precisa pagar o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) como Microempreendedor Individual (MEI).
Entretanto, essa contribuição não é obrigatória e estima-se que apenas 23% dos motoristas de aplicativo paguem o MEI, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “No entanto, nessa modalidade, sabe-se que há uma alta inadimplência, acima dos 40%”, informa o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Leandro Medeiros, presidente do sindicato de São Paulo, lembrou que muitos motoristas não pagam o MEI.
“Um amigo nosso está com câncer e não pagava o MEI e hoje está dependendo de ajuda. Nosso trabalhador não pode continuar dependendo de ajuda e de vaquinha. Ele precisa depender do seu próprio trabalho. E caso ele fique enfermo, ele precisa ter seu ganho garantido pela Constituição”, defendeu.
Eduardo Lima de Souza, presidente da Amaps, argumentou que o trabalhador deveria continuar a contribuir como MEI. “O governo retirou a autonomia do motorista de escolher qual modelo de contribuição ele quer fazer. Sendo que o MEI, por ter um CNPJ para quem contribui, favorece o motorista. O motorista consegue comprar carros com desconto através do CNPJ, consegue abrir um crediário junto aos postos de gasolina”, considerou.
CLT
A adesão ou não à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é um tema que divide os motoristas e suas organizações. A carteira assinada para motoristas chegou a ser defendida pelos sindicatos na mesa de negociação criada pelo governo, mas não foi incluída no projeto de lei.
Leandro Medeiros, presidente do sindicato paulista e da Federação Nacional dos Sindicatos dos Motoristas de Aplicativos (Fenasmapp), afirmou que a não adesão à CLT foi influenciada pelas últimas decisões do Judiciário.
“Como sindicato, sempre defendi o vínculo e a CLT. No entanto, o Judiciário entendeu de forma diferente. Se não acatássemos esse entendimento, o que aconteceria com a categoria? Ela continuaria como está hoje, sem nenhum benefício”, ponderou.
O Supremo Tribunal Federal (STF) tem derrubado decisões da Justiça do Trabalho que reconheciam o vínculo empregatício entre motoristas e aplicativos. Nessa semana, a Uber pediu a suspensão de processos sobre vínculo trabalhista até que o STF decida a questão definitivamente.
Solimar Menacho, presidente do sindicato de Mato Grosso, disse que sempre defendeu o vínculo pela CLT. “No entanto, para nossa surpresa, o PL chegou como autônomo”, lamentou. O projeto cria a categoria de “trabalhador autônomo por plataforma”.
Ameaça
A professora da PUC de Minas Gerais, Ana Carolina Paes Leme, elaborou sua tese de doutorado sobre a luta trabalhista dos motoristas de aplicativos, entrevistando 17 lideranças sindicais de diferentes estados do país.
A pesquisadora concluiu que a rejeição de parte dos representantes à CLT é baseada no medo de perder o trabalho.
“Os motoristas não defendem o reconhecimento do vínculo de emprego pelo receio de ‘a Uber ir embora’ e eles perderem o trabalho. E essa ameaça é produzida pelas empresas e reproduzida diariamente entre os trabalhadores e trabalhadoras”, explicou a especialista.